“Contenham esse avanço... Façam qualquer coisa, por menor que seja... Mantenham aberta ainda que seja uma só porta dentre cem, pois conquanto que tenhamos pelo menos uma porta aberta, não estaremos numa prisão.”
(G.K.C)

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Meu lar, meu castelo *

William Pitt

O lar de um homem é o seu castelo. O homem mais pobre desafia, em sua casa, todas as forças da coroa. A sua cabana pode ser muito frágil, o teto pode tremer, o vento pode soprar entre as portas mal ajustadas, a trombeta pode penetrar, mas o Rei da Inglaterra não pode nela entrar.

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* "... a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador..." (Art. 5º, inciso XI da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988)

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A ciência, as "leis" da natureza e os contos de fadas


Chesterton

[....] há certas seqüências ou desenvolvimentos (casos de uma coi­sa seguindo outra) que são, no verdadeiro sentido da pala­vra, razoáveis. Eles são, no verdadeiro sentido da palavra, necessários. Assim são as seqüências matemáticas e mera­mente lógicas. Nós do país das fadas admitimos essa razão e essa necessidade. Por exemplo, se as Irmãs Feias são mais velhas que a Cinderela, então é (num sentido irônico e ter­rível) necessário que a Cinderela seja mais jovem do que as Irmãs Feias. Não há como fugir disso.

Se Jack é filho de um moleiro, um moleiro é o pai de Jack. A razão fria o decreta de seu terrível trono: e nós do país das fadas nos submete­mos. Se todos os três irmãos andam a cavalo, há seis animais e dezoito pernas envolvidos: isso é racionalismo verdadeiro, e o país das fadas está cheio dele.

Mas quando ergui a cabeça acima da cerca dos elfos e comecei a notar o mundo natural, observei um fato extraordinário. Observei que homens eruditos de óculos estavam conversando das coisas reais que aconteciam como se ELAS fossem racionais e inevitáveis. Falavam como se o fato de as árvores darem frutos fosse tão NECESSÁRIO quanto o fato de que uma árvore mais duas são três. Mas não é. Há uma enorme diferença pelo teste do país das fadas, que é o teste da imaginação. Não podemos IMAGINAR dois mais um não somando três. Mas pode-se facilmente imaginar árvores que não produzem frutos; pode-se imaginá-las produzindo candelabros ou tigres pendurados pelo rabo.

Esses homens de óculos falavam muito de um homem chamado Newton, que foi atingido por uma maçã e descobriu uma lei. Mas não era possível levá-los a ver a distinção entre uma lei verdadeira, uma lei da razão, e o simples fato de maçãs caírem. Se a maçã atingiu o nariz de Newton, o nariz de Newton atingiu a maçã. Essa é uma verdadeira necessidade: pois não podemos conceber uma coisa ocorrendo sem a outra. Mas, podemos muito bem imaginar a maçã NÃO caindo sobre seu nariz; podemos imaginá-la voando fogosa pelos ares para atingir algum outro nariz, pelo qual ela sentia uma aversão mais clara.

Sempre fizemos em nossos contos de fadas essa distinção nítida entre a ciência das relações mentais, na qual há de fato leis, e a ciência dos fatos físicos, nos quais não há nenhuma lei, mas apenas estranhas repetições.

O cientista diz: "Corte o pedúnculo, e a maçã cairá"; mas diz isso calmamente, como se uma idéia de fato levasse à outra. A bruxa dos contos de fada diz: "Toque a corneta, e o castelo do ogro cairá"; mas ela não diz isso como se fosse alguma coisa em que o efeito obviamente surgisse da causa. Mas os cientistas quebram a cabeça até conseguirem imaginar uma conexão mental necessária entre uma maçã que deixa o galho e uma maçã atingindo o chão. Eles realmente falam como se tivessem descoberto não apenas um conjunto de fatos maravilhosos, mas também uma verdade ligando esses fatos. Falam como se a ligação de duas coisas fisicamente estranhas as conectasse filosoficamente. Sentem que, pelo fato de uma coisa incompreensível sempre vir depois de outra coisa incompreensível, as duas de certo modo constituem uma coisa compreensível. Dois enigmas negros constituem uma resposta branca.

No país das fadas nós evitamos a palavra "lei"; mas na terra da ciência eles são especialmente apaixonados por ela. Os contos, de qualquer maneira, são contos; ao passo que a lei não é uma lei. Uma lei implica que conhecemos a natureza da generalização e da execução; não simplesmente que notamos alguns dos efeitos. Se há uma lei dizendo que os batedores de carteira devem ser presos, isso implica que há uma ligação mental imaginável entre a idéia da prisão e a idéia de bater carteiras. E sabemos qual é essa idéia. Podemos dizer por que tomamos a liberdade de alguém que toma liberdades. Mas não podemos dizer por que um ovo pode transformar-se num pinto, assim como não podemos dizer por que um urso poderia transformar-se num príncipe encantado. Como IDEIAS, o ovo e o pinto estão muito mais distantes entre si do que o urso e o príncipe; pois nenhum ovo por si só sugere um pinto, ao passo que alguns príncipes realmente sugerem ursos.

Quando nos perguntam por que os ovos se transformam em pássaros ou por que as frutas caem no outono, devemos responder exatamente como a fada madrinha responderia se Cinderela lhe perguntasse por que os ratos se transformaram em cavalos ou por que as roupas dela desapareceram depois da meia-noite. Devemos responder que é MÁGICA. Não é uma "lei", pois não entendemos sua fórmula geral. Não é uma necessidade, pois, embora contemos com esse tipo de acontecimento na prática, não temos o direito de dizer que ele deve sempre acontecer.

Todos os termos usados nos livros de ciência, "lei", "necessidade", "ordem" e assim por diante, são realmente não-intelectuais, porque pressupõem uma síntese interior, que nós não possuímos. As únicas palavras que sempre me satisfizeram como descrições da natureza são os termos usados nos contos de fada, "sortilégio", "feitiço", "encantamento". Eles expressam a arbitrariedade do fato e do mistério. Uma árvore dá frutos porque é uma árvore MÁGICA. A água corre morro abaixo porque está enfeitiçada. O sol brilha porque sob encanto.

Eu nego totalmente que isso seja fantástico ou mesmo místico. É o homem que fala de "uma lei" que nunca viu, que é místico. Ou melhor, o cientista ordinário é estritamente um sentimental. Um sentimental no sentido essencial, de estar mergulhado em meras associações que o vão carregando. Ele viu tantas vezes pássaros voando e botando ovos que sente como se devesse existir alguma fantástica e delicada ligação entre as duas idéias, quando não há nenhuma.

Um amante desamparado talvez não seja capaz de dissociar a lua de seu amor perdido; assim o materialista é incapaz de dissociar a lua da maré. Nos dois casos não há conexão, excetuando-se o fato de que alguém viu essas coisas juntas. Um sentimentalista talvez derramasse lágrimas ante o perfume de uma macieira em floração, porque, por uma obscura associação pessoal, ela lhe traz à memória os tempos de criança. Assim também o professor materialista (embora esconda as lágrimas) é, todavia, um sentimental, porque, por uma obscura associação pessoal, a macieira em floração lhe traz à memória as maçãs. Mas o frio racionalista do país das fadas não vê razão por que, em abstrato, a macieira não deva dar tulipas encarnadas; isso às vezes acontece no país dele.

Todo o intenso materialismo que domina a mente moderna apóia-se, em última análise, numa suposição; uma suposição falsa.

sábado, 24 de outubro de 2009

Exemplos de fracassos são úteis, quando nos permite mostrar que, muitas vezes, uma posição sedutora é insustentável diante do bom-senso, ou que uma posição equilibrada não é sustentável diante de fracassados, por não ter sido sedutora o bastante. Vê-se isso em toda a história.

sábado, 17 de outubro de 2009

O pensamento moderno

Chesterton

Você já viu alguma vez alguém perder um salto por não ter recuado o suficiente? Esse é o pensamento moderno. Confia tanto em para onde está indo, que não sabe de onde vem.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009


"Lúcia passava um tempão na popa jogando xadrez com Ripchip. Era engraçado vê-lo pegar com as duas patas as peças muito grandes para ele e esticar-se na ponta dos dedos quando tinha de fazer jogadas no centro do tabuleiro. Era um bom jogador e, quando prestava atenção ao que estava fazendo, era certo e sabido que ganhava. Às vezes, porém, Lúcia ganhava, pois o rato fazia coisas incríveis, pondo um cavaleiro em perigo por causa de uma dama ou de um castelo. De repente, esquecia-se de que estava jogando xadrez, julgando-se em um combate real, obrigando o cavaleiro a proceder como ele faria se estivesse no seu lugar. Pois tinha o espírito cheio de arrebatamentos de outros tempos, de missões de morte ou glória, de decisões heróicas".

A viagem do Peregrino Alvorada, Crônicas de Nárnia, C. S. Lewis.

domingo, 11 de outubro de 2009

Os dotes do corpo e os dotes da alma

Dom Quixote

"... há duas formosuras: uma da alma, outra do corpo; a da alma campeia, e mostra-se no entendimento, na honestidade, no bom proceder, na liberalidade e na boa criação, e todas estas partes cabem e podem estar num homem feio; e, quando se põe a mira nesta formosura e não na do corpo, o amor irrompe então com ímpeto e vantagem. Bem vejo que não sou formoso, mas também conheço que não sou disforme; e basta a um homem de bem não ser monstro, para ser querido, contanto que tenha os dotes da alma..."

sábado, 10 de outubro de 2009

O poeta e o historiador

Miguel de Cervantes

O poeta pode contar ou cantar as coisas, não como foram mas como deviam ser; e o historiador há-de escrevê-las, não como deviam ser e sim como foram, sem acrescentar ou tirar nada à verdade.

Quem sou - Parte II

Cumprindo a cada dia uma proeza muito rara nesse nosso tempo: continuar fiel a si mesmo. E, por isso mesmo, correndo o risco de enlouquecer à vista desse mundo. No entanto, se assim for, enloquecerei por amor à sanidade.

domingo, 4 de outubro de 2009