“Contenham esse avanço... Façam qualquer coisa, por menor que seja... Mantenham aberta ainda que seja uma só porta dentre cem, pois conquanto que tenhamos pelo menos uma porta aberta, não estaremos numa prisão.”
(G.K.C)

segunda-feira, 9 de março de 2009

Desejo sexual x Eros

O desejo sexual é o "amor" que anseia pela auto-satisfação. C. S. Lewis descreve esse desejo como o de um homem buscando um prazer para qual a mulher é apenas uma peça necessária para realizá-lo. O quanto ele realmente gosta dela pode ser descoberto cinco minutos depois de ter obtido o que deseja, "ninguém guarda o maço de cigarros depois de tê-los fumado", diz Lewis.

Luxúria é sua pior definição e, na melhor das hipóteses, o desejo sexual é a ânsia física por alguém do sexo oposto. No entanto, a simples experiência sexual que se desenvolve sem Eros não pode ser encarada como algo "impuro". Lewis nos diz que "se todos os que se deitarem juntos sem estar no estado de Eros fossem abomináveis, nós todos viemos de uma linhagem espúria. As épocas e lugares em que o casamento depende de Eros são uma minoria. A maior parte de nossos ancestrais se casaram cedo com parceiros escolhidos por seus pais por razões que nada tinham a ver com Eros. Prestavam-se ao ato sem qualquer outro estímulo além do simples desejo 'animal'". Eros pode se desenvolver a partir do desejo sexual.

E continua Lewis com maestria: "Porém, no geral, o que acontece primeiro é simplesmente uma deliciosa preocupação com o ser amado - uma preocupação geral, inespecífica, com a mulher no total. O homem nestas condições na verdade não tem tempo para pensar em sexo, pois está muito ocupado pensando numa pessoa. O fato de ela ser uma mulher é muito menos importante do que ser ela mesma. Ele está cheio de desejo, embora este não tenha uma tonalidade sexual. Se lhe perguntasse o que quer, sua resposta sincera geralmente seria: “Continuar pensando nela”. É o amor contemplativo". Eros é àquele estado que chamamos de “estar amando”.

O desejo sexual, sem Eros, deseja a coisa em si; Eros deseja o ser amado [....]

Eros faz com que o homem não deseje uma simples mulher, mas uma mulher especial. De algum modo misterioso, mas indiscutível, o amante deseja a amada, ela mesma, e não o prazer que lhe pode proporcionar.

Sem Eros, o desejo sexual, como qualquer outro desejo, é um fato sobre nós mesmos. Dentro de Eros ele é um fato a respeito do ser amado [....] Eis a razão pela qual Eros, embora seja o rei dos prazeres, sempre, em seu auge, tem a atitude de considerar o prazer como um subproduto.

Mas para aqueles que acham que Eros é um pouco sem graça para as aventuras do prazer sexual, está enganado. Eros não é frio quanto à sexualidade. Existe em Eros, um prazer carnal saudável e tão sublime que o simples desejo sexual, frente a ele, torna-se ínfimo. Os antigos gregos chamavam esse sub-elemento de Vênus.

A sexualidade pode operar sem Eros ou como parte de Eros, isto é, com Vênus. E isso é um tanto formidável, porque se Eros é um sentimento elevado que tem a amada como uma jóia preciosa e frágil que merece todo cuidado, que torna tudo tão solene e melancólico, Vênus, fundido em Eros, é um sentimento um tanto animal e quase cômico.

Vênus é escarnecedor e maldoso; brinca com os comportamentos mais íntimos. Muitas vezes zomba com os amantes. Quando temos a situação perfeita para sua realização, Vênus nos troça e foge. Isso vem sob efeito de indisposição, ou de outras coisas mais que acabam por afastar o ato. De outra forma, quando a situação parece impossível, nos diz Lewis, "e nem mesmo olhares podem ser trocados - em trens, lojas e festas intermináveis - ela [Vênus] os assalta com toda a sua força. Uma hora mais tarde, quando o tempo e o lugar são propícios, ela se retira misteriosamente; talvez de um só deles. Que perturbação isso deve causar - quantos ressentimentos, suspeitas, vaidades feridas e toda a conversa corrente sobre as 'frustrações' - naqueles que a deificaram! Mas os amantes sensatos riem. Tudo faz parte do jogo; um jogo de luta-livre, e as escapadas, quedas e colisões de cabeça devem ser tratadas como uma brincadeira".

Vênus, de certa forma, faz o homem unir sentimentos extremos, isto é, o amor sublime e o desejo animal. Daí a possibilidade de haver brincadeiras ásperas e até "selvagens" entre verdadeiros amantes possuídos de Eros.

Eros é formidável, é pleno em se tratando de amor entre amantes. Por um lado, nos faz preferir ser infelizes com o ente amado a ser felizes em quaisquer outros termos, ser miserável com ela do que feliz sem ela. Por outro lado, Eros é combustível que acende um fogo abrasador pela amada, um impetuoso desejo de possuí-la. É ao mesmo tempo brisa suave e brasa candente, carinhos ternos e desejos ardentes.

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