Chesterton, Ortodoxia.
O liberalismo degradou-se em liberalidade. Os homens tentaram transformar o verbo "revolucionar" de transitivo em intransitivo. Os jacobinos não apenas sabiam dizer contra que sistema se rebelariam, mas também (o que é mais importante) contra que sistema NÃO se rebelariam, o sistema em que confiariam.
Mas o novo rebelde é um cético, e não confia inteiramente em nada. Não tem nenhuma lealdade; portanto, ele nunca poderá ser de verdade um revolucionário. E o fato de que ele duvida de tudo realmente o atrapalha quando quer fazer alguma denúncia. Pois toda denúncia implica alguma espécie de doutrina moral; e o revolucionário moderno duvida não apenas da instituição que denuncia, mas também da doutrina pela qual faz a denúncia. Assim, ele escreve um livro queixando-se de que a opressão imperialista insulta a pureza das mulheres; e depois escreve outro (sobre o problema do sexo) no qual ele mesmo a insulta. Ele amaldiçoa o sultão pela perda da virgindade de garotas cristãs; e depois amaldiçoa a sra. Grundy pela preservação dela. Como político, ele grita que toda guerra é um desperdício de vida, e depois, como filósofo, grita que toda vida é um desperdício de tempo.
Um pessimista nisso denunciará um político por matar um camponês; e depois, pelos mais elevados princípios filosóficos, provará que o camponês deveria ter-se suicidado. Alguém denuncia o casamento como uma mentira; e depois denuncia os libertinos aristocráticos por tratarem essa mesma instituição como uma mentira. Alguém chama a bandeira de bugiganga; e depois acusa os opressores da Polônia ou da Irlanda de terem suprimido aquela bugiganga. O adepto dessa escola primeiro participa de uma reunião política, na qual se queixa de que os selvagens são tratados como se fossem animais; depois apanha o chapéu e o guarda-chuva e vai para uma reunião científica, na qual prova que eles são praticamente animais.
Em resumo, o revolucionário moderno, sendo um cético sem limites, está sempre ocupado em minar suas próprias minas. No seu livro sobre política ele ataca os homens por espezinharem a moralidade; no seu livro sobre ética ele ataca a moralidade por espezinhar os homens. Portanto, o homem moderno em estado de revolta tornou-se praticamente inútil para qualquer propósito da revolta. Rebelando-se contra tudo, ele perdeu o direito de rebelar-se contra qualquer coisa específica.